dc.description.abstract | O desafio do momento
Nos anos 60, quando nossa profissão foi regulamentada, a demanda de psicólogos no mercado de trabalho era maior que o número de profissionais
disponíveis. A criação de cursos de Psicologia era uma necessidade que
se impunha. Nessa mesma época a pressão social pela abertura de maiores oportunidades aos jovens que tinham o direito de frequentar a universidade também era muito grande. As vagas eram limitadas,em todas as carreiras: o ensino era elitista, nada tendo a ver com a realidade. O ensino superior havia que ser repensado, como de resto se pretendia fazer com toda a organização
social, discriminatória e inadequada. A partir de 1964, contudo, o que se
vem tentando é reorganizar a sociedade, mas com outros pressupostos. O
poder, de acordo com esses pressupostos, deve permanecer em mãos de
uma minoria "iluminada", que se julga capaz de fazer vigorar um capitalismo
assumido, contornando as contradições que o sistema traz em si mesmo
através do emprego da repressão dura ou de medidas aparentemente democratizantes mas que mantenham a essência do modelo escolhido.
Foi o que se fez com a universidade. Abafados os movimentos estudantis,
tratou-se de ampliar o número de vagas, elevando-se de um para três por
cento a quantidade de estudantes que chegam a um curso superior. Só que
a forma adotada para a expansão foi tornar o ensino um bom investimento,
capaz de atrair os capitalistas pela perspectivas de lucros fáceis.
Debilitaram-seas instituições sérias focos de indesejável reflexão — e
incentivaram-se as indústrias de diplomas. A qualidade do ensino equipara
as faculdades, hoje, a verdadeiros colégios de segunda categoria, descaracterizada a universidade como núcleo de desenvolvimento de uma cultura critica voltada para os interesses da coletividade. E vieram aos montes as novas escolas de psicologia, como todas as outras /lançando levas de novos profissionais num mercado saturado e sem condições de viabilizar economicamente a demanda reprimida. Dentro desse contexto è que ainda
mais se beneficia o capital. Com o excesso de profissionais à busca de
oportunidades, os salários tendem a ser cada vez mais baixos. As reivindicações por melhores condições de trabalho e por remuneração pelo menos mais digna são abafadas pelo fantasma do desemprego e pelos que batem às portas das empresas, prontos a ocuparem as vagas que surgirem, sem maiores exigências. É cada vez mais frequente, nas empresas,
o impedimento da reflexão por parte dos profissionais e de sua associatividade
para as questões pertinentes ao seu dia-a-dia. O que se levanta hoje é, então, a necessidade de a categoria se inteirar da sua condição cada vez mais característica de trabalhadores que dependem do emprego para subsistirem e
para colocarem em prática os serviços para os quais foram .treinados.
Essa perspectiva è que nos permite definir e compreender o papel das entidades que procuram organizar os trabalhadores da Psicologia, como è o
caso do CRP. É preciso uma atuação lúcida e corajosa no sentido de fazer
valer o direito ao trabalho. Ampliar as oportunidades, lutando contra discriminações e formando ao lado da população que se vê privada do acesso aos benefícios da ciência psicológica. Garantir aos que estão trabalhando a
segurança e a estabilidade permanentemente ameaçadas pela ganância dos
empregadores, contra a rotatividade e contra o aviltamento salarial. Desenvolver as respostas que a própria Psicologia pode oferecer como contribuições para solucionar os problemas ligados ao sofrimento humano.
A atuação do CRP-06 no episódio da demissão se professores-psicólogos e
supervisores do curso de Psicologia das Faculdades Metropolitanas Unidas,
em São Paulo, deve ser entendida por esse prisma. Há que se exigir os
direitos dos que trabalham. As vagas por eles deixadas, quando demitidos,
não representam reais oportunidades para os que venham a substitui-los: a
prazo curto serão estes os próximos a serem ceifados. A manobra dos tubarões do ensino superior desconsidera a dignidade profissional dos psicólogos, pela forma como brincam com a vida dos professores e supervisores (admitindo e demitindo ao seu belprazer, pelo salário que quiserem) e, mais do que isso até, pelo desprezo que demonstram para com a sociedade, formando psicólogos cada vez mais despreparados. Torna-se assim patente, ao nosso entender, a necessidade de a categoria se aglutinar para refletir sobre a sua condição e de encontrar as formas de ação que venham a garantir um posicionamento significativo frente a estas questões. Se assim não for, permaneceremos Inertes e marginalizados ante as exigências do nosso tempo, bem como coniventes com a situação de exploração que degrada. | pt_BR |